segunda-feira, 22 de abril de 2019


Chico Buarque de Holanda

Cada um cria seus apegos, e os apegos podem ser vários. Chico, confesso, é um apego meu. Tenho ouvido pouco, menos que devo, mas sempre me pego parafraseando Chico. Um gênio. Um grandioso gênio. Um dos maiores...
Às vezes surgem como sussurros frases soltas que me valem o dia... Resolvi compartilha-las, em seu tempo, à medida que forem assopradas...

"Filha do medo
a raiva
é mãe da covardia"

segunda-feira, 3 de abril de 2017

Infância

Tenho uma compulsão poética por ler sobre infâncias... Olhares sobre ela, "aurora da vida", me encantam!
Adultos escrevendo sobre infância são crianças falando delas mesmas, só que depois.

Segue, Ivan (de tirar água dos olhos) Junqueira:





O AEROPLANO

Quando eu fiz cinco anos,
meu pai deu-me de presente um aeroplano
que ele próprio construíra
com finas hastes de bambu e papel de seda.
Tão leve quanto uma libélula,
o frágil engenho voou até desaparecer
por detrás do muro do quintal
e dos últimos reflexos de um poente de verão.
Ninguém jamais o encontrou.
Eu ia na cabine. Eu e minha infância,
que nunca mais voltou.



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sábado, 16 de janeiro de 2016

Hai!



Serão olvidadas
as estórias
ouvidas?



segunda-feira, 23 de novembro de 2015

Ana C.

É Ana Cristina César. Mas pode ser também Caio Fernando Abreu.










sexta-feira, 9 de outubro de 2015

O Amanuense

O Amanuense
(singela homenagem a Cyro dos Anjos)



Teto, rosto, água, café, paletó, porta, roseira, orvalho, chão, gato, sol, portão, calçada, aceno, taxímetro, volante, trânsito, buzina, velha, sinal, corrida, Aqui ta bom!, dinheiro, calçada, passo, loja, loja, café, loja, escola, crianças, elevador, sala, jornal, telefone, aviso, cadeira, máquina, papel, cigarro, café, relógio, conversa, teto, pernas, atenção, desatenção, café, telefone, convite, elevador, ansiedade, calçada, porta de vidro, beijo, “Oi, que bom que veio”, feijão, salada, café, conversa, olho, cintura, mão na cintura, abraço, “Tchau”, calçada, elevador, sono, café, cigarro, cadeira, lápis, concentração não, inspiração, livro, Drummond, “E agora?”, resignação, gastrite, café, relógio, conversa, cafezinho, cigarro, água, bolacha, mesa, cadeira, pés, elevador, “Tchau, seu Adonias”, calçada, rua, caminhada, pasta, dores, cigarro, mesas, balcão, chopp, cigarro, “Flamengo ta mal!”, joelho de porco, lua, conhaque, “Bom era o Zico”, dinheiro, “Até mais ver...”, hálito, calçada, ônibus, luzes, tristeza, mãos, joelhos, sono, escada, calçada, portão, lua, gato, chão, sereno, roseira, porta, tapete, cabide, cigarro, cueca, cama. Sono... sono... zszssszzszzzz



terça-feira, 6 de outubro de 2015

Imperfeição





Imperfeição

Perfeição não há. Dito isso, entendido isto, a vida torna-se mais leve. Saber dos defeitos inatos e aceitá-los é o primeiro passo rumo à convivência consigo mesmo. E conviver bem com seus eus é o primeiro passo para viver em comunhão (viver com), socialmente.

A noção de que devemos ‘buscar a perfeição’, seja no trabalho ou na academia, tem gerado pessoas com a frustração em entropia. A perfeição não é para o homem! Não é natural a ele nem muito menos ela é atingível. Buscar, portanto, algo que tem estas premissas é seguir fatalmente rumo à frustração plena.

Aceitar a condição de imperfeito, reconhecer defeitos, é uma dádiva! O homem, ao ver-se cumulado de defeitos, é mais humano. Perceber a sua beleza, a sua inteligência e os seus dons é tão importante quanto reconhecer suas feiúras, suas incapacidades e suas deficiências. Não há amor sem ódio... somos todos amorosos e odiosos por natureza! Não há beleza plena, “todo mundo tem remela”, inclusive a bailarina! Não há força sem deslizes; competências sem incapacidades; certezas sem dúvidas.

Compreender que a força do antônimo é muito maior que a linha reta dos sinônimos é sentir-se abençoado. Importante é buscar o equilíbrio para perceber que até os defeitos nos são necessários. Sob uma ótica taoista, poder-se-ia dizer que “quanto mais Yin, menos Yang, quanto mais Yang, menos Yin”. Há mal e bem; alegria e tristeza; amor e ódio; beleza e feiúra; feminino e masculino; agressividade e delicadeza em nós. Somos assim formados. Somos assim construídos.

Aprender a amar seu ódio e odiar seu amor (difícil isso!) é acalentador! “É o ódio que mantém a intensidade do amor”, diria Pedro Luís. Conviver com sua feiúra e perceber, sabiamente, beleza dentro dela é muito melhor que escondê-la num canto escuro do seu guarda-roupa. Enxergar-se perdedor é tão nobre quanto sagrar-se vencedor...

Perfeição, devemos aprender, é estado de Deus. Somos humanos. Cheios de defeitos e qualidades. Fracos por natureza. Fortes por natureza. 







quinta-feira, 1 de outubro de 2015

Grande Almanaque Fantasioso dos Maiores Amores Já Vividos na Terra


O Grande Livro...


Dos amores todos que a terra já presenciou, jurava, nunca houve um parecido com o dele por ela. Sabia disso pois, ao pesquisar no Grande Almanaque Fantasioso dos Maiores Amores Já Vividos na Terra, percorreu minuciosamente cada um dos trezentos e quarenta e sete zilhões de registros. De fato! O seu amor era muito acima da média.

A caminho de casa, na estradinha florida de lírios amarelos e sombreada de pés de Jenipapo e Cajá, subindo a Serra dos Ventos em Curva, sentia orgulho de sua descoberta. Foram trinta e nove anos pesquisando amores, lendo e se emocionando com os pregressos registros, sob velas às noites escuras, sobre a grama nas manhãs frescas das primaveras, tantas páginas, tanta saliva... Estava feliz! Sentia-se recompensado pelo árduo trabalho até poder, então, escrever seu nome, junto ao de sua amada, no tal livro sem fim!

Eis que, àquela hora, setecentos e três registros novos já existiam frente ao seu. Todos, somados aos zilhões do histórico, eram, per si, igualmente dignos da inscrição no Grande Almanaque Fantasioso dos Maiores Amores Já Vividos na Terra.




quarta-feira, 16 de setembro de 2015

Tabacaria

Se juntarmos Tabacaria, Fausto, Encontro Marcado, Farewell... em uma sacola, devemos jogá-la fora rápido!
...pode ser muito perigoso carrega-la pela vida.





Recitado por Abujamra.
Seleção de trechos deste que escreve.

Fui até ao campo com grandes propósitos.
Mas lá encontrei só ervas e árvores,
E quando havia gente era igual à outra.


Quantas aspirações altas e nobres e lúcidas -
Sim, verdadeiramente altas e nobres e lúcidas -,
E quem sabe se realizáveis,
Nunca verão a luz do sol real nem acharão ouvidos de gente?
0 mundo é para quem nasce para o conquistar
E não para quem sonha que pode conquistá-lo, ainda que tenha razão.

Olha que não há mais metafísica no mundo senão chocolates.
Olha que as religiões todas não ensinam mais que a confeitaria.
Come, pequena suja, come!
Pudesse eu comer chocolates com a mesma verdade com que comes!

Meu coração é um balde despejado.
Como os que invocam espíritos invocam espíritos invoco
A mim mesmo e não encontro nada.


Fiz de mim o que não soube,
E o que podia fazer de mim não o fiz.
A roupa que vesti era errada.
Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
Quando quis tirar a máscara,
Estava pegada à cara.
Quando a tirei e me vi ao espelho, Já tinha envelhecido.
Estava bêbado, já não sabia vestir a roupa que não tinha tirado.
Mas o Dono da Tabacaria chegou à porta e ficou à porta.
Olho-o com o desconforto da cabeça mal voltada
E com o desconforto da alma mal-entendendo.
Ele morrerá e eu morrerei.
Ele deixará a tabuleta, eu deixarei versos.
A certa altura morrerá a tabuleta também, e os versos também.
Depois de certa altura morrerá a rua onde esteve a tabuleta,
E a língua em que foram escritos os versos.
Morrerá depois o planeta girante em que tudo isto se deu.
Em outros satélites de outros sistemas qualquer coisa como gente
Continuará fazendo coisas como versos e vivendo por baixo de coisas como tabuletas,
Sempre uma coisa defronte da outra, Sempre uma coisa tão inútil como a outra ,
Sempre o impossível tão estúpido como o real,
Sempre o mistério do fundo tão certo como o sono de mistério da superfície,
Sempre isto ou sempre outra coisa ou nem uma coisa nem outra.
Acendo um cigarro ao pensar em escrevê-los
E saboreio no cigarro a libertação de todos os pensamentos.
Sigo o fumo como uma rota própria,
E gozo, num momento sensitivo e competente,
A libertação de todas as especulações
E a consciência de que a metafísica é uma conseqüência de estar mal disposto.


0 homem saiu da Tabacaria (metendo troco na algibeira das calças?).
Ah, conheço-o; é o Esteves sem metafísica.
(0 Dono da Tabacaria chegou á porta.)
Como por um instinto divino o Esteves voltou-se e viu-me.
Acenou-me adeus, gritei-lhe Adeus ó Esteves!, e o universo
Reconstruiu-se-me sem ideal nem esperança, e o dono da tabacaria sorriu.




sexta-feira, 11 de setembro de 2015

Caio. Fernando. Abreu.









Já se passaram alguns anos desde a primeira vez que o li.
Caio. Intenso. Nervoso. Triste. Angustiado. Doentio. Depressivo. Superdepressivo. Docemente esperançoso. Verborrágico. Enorme... grande!
Caio... Perseguido. Exilado. Coração partido. Mulher. Cabelos vermelhos. Brincos. Óculos. Vidros quebrados.

...

Historinha com final triste...

Um dia, andando pelas ruas de Porto Alegre, um conhecido lhe perguntou...
- Caio, quo vadis?
Olhar tímido, ossos e pele e vodka responderam:
- Rua Lopes Chaves, 546.
- Mas essa rua... essa rua fica em São Paulo!? Não é mesmo?

Não respondeu. Seguiu, passos lerdos, ao encontro de Mario de Andrade.
(Morreu no mesmo dia que o pai de Macunaíma, 51 anos depois)






sexta-feira, 4 de setembro de 2015

Flores



Tinha desverbalizado sua relação com o mundo.
Cansou-se de verbos e, portanto, aboliu-os do seu costume. Ele que era, agora nem estava.
Por isso ele passarinho a manhã, arco-íris o fim da tarde e riacho seus pés.
Numa dessas alegrias, Guimarães o tempo, Drummond o vento, Lispector a alma. Boniteza, seu benzinho, um encanto! Casa, filhos lindos, casa, jardim, fantasia! Felicidade...
Sua vida flores. Seus sonhos, realidades. Lutas, dores, sina. Amores.

Dever cumprido! (substantivamente).